26/12/07

A LUA DE FACA E GARFO

Andava um lápis amarelo e preto a rabiscar e a escrever naquela terra. Todas as manhãs e todos os dias o lápis escrevia nas paredes, desenhava nas portas, deixava recados, fazia reclamações que ninguém entendia. Um dia de manhã cedo quando os homens que não sabiam escrever acordaram, viram o lápis sentado numa mesa ali no meio do largo. O lápis chamou-os e eles vieram um a um. Então, o lápis lá disse: Contem-me tudo tudo.
E os homens contaram, contaram, contaram e o lápis escreveu, escreveu, escreveu. Mas de repente formou-se uma longa fila. Todos queriam contar-lhe qualquer coisa para ele escrever. E todos queriam ver os papéis, as letras, os movimentos circulares do lápis. No fim do dia todos tinham um papel com letras, muitas letras feitas num papel branco. Nesse fim de tarde o lápis afiou-se, mas os homens quando viram o seu tamanho a reduzir-se gritaram em coro: Não! Não! Nessa noite em todas as casas as mulheres questionaram os maridos, os filhos, as cunhadas, os vizinhos questionaram os vizinhos.
Na manhã seguinte o lápis lá estava de bancada montada. Mas, nesse dia só iria ler o que lhe fora contado pelos homens. A notícia correu de boca em boca e de um momento para o outro a praça encheu-se de gente. Tanta gente que mal cabiam na praça.
Às 10h o lápis pôs-se de pé e anunciou: que iria proceder à leitura do que fora dito no dia anterior por todos os presentes e não só.
Começou por ler o que lhe tinham contado os homens mais velhos. Mas nesse momento ouviu-se um ronco colectivo e muitos dos velhos caíam uns por cima dos outros.
Então o lápis parou de ler e disse: Vêem como um lápis é poderoso! Vêem como?
Depois ou outros ajudaram os mais velhos a pôr-se de pé. Mas quando o lápis disse: Agora vou ler tudo, tudo, tudo. Nesse instante ouviu-se um: Não! Não! Então, todos disseram em coro: Mas nós não contá mos nada! Nada!
E o lápis disse: Nada? Então vocês não me contaram que o Regedor é louco? Não me disseram que o homem come a Lua de faca e garfo? Não me contaram também ele voa num zepelim? Que come balões com letras? Gaivotas? Que ouve os Santos no céu? E ainda, que o zepelim é feito de ouro? Que o Regedor de noite se transforma em lobisomem? Pois olhem bem para mim! Olhem! Fiquem sabendo vocês também que ele não existe! E vocês são desenhados por mim!

19/12/07

UM DUENDE POUSOU-LHE NA CABECEIRA

Nessa manhã viu um duende pousar-lhe na cabeceira.
Depois, como era seu hábito vestiu-o de azul. deu-lhe os skis e desceram a montanha grande e branca.
Depois, quando cairam olharam o céu amarelo repleto de duendes roxos, verdes, encarnados e de muitas outras cores. Os duendes do céu desceram, desceram, mas quando chegaram perto deles continuaram a descer, a descer. E num passo de mágica toda a montanha se transformou em algodão doce. Com milhares de duendes de todas as cores, com skis de chocolate amarelo, azul, lilás e verde. Mas, de repente, os duendes voaram de montanha em montanha e pousavam nas nuvens, nas estrelas a comer chupas-chupas e a pescar sereias e baleias cinzentas. Elas eram tão grandes, tão grandes que houve um dos duendes que caiu ao lago das baleias cinzentas. Mas nesse lago a água era de chocolate branco como as montanhas grandes.
Mas nessa manhã só um lhe pousou na cabeceira. Os outros eram de chocolate amarelo, azul, lilás e verde.

17/12/07

ELA VAGUEAVA ENTRE ELE E O CÉU. ELE JÁ LÁ ESTAVA

Ele escrevia, escrevia, escrevia. Ela destruía, destruía, destruía. Ele comia poemas, canetas, sinetas, borrachas, blocos, pautas e olhava-a. Ela destruía a casa, o cão, os poemas, os blocos, as canetas.
Ele berrava contra o ruído do sino da igreja. Ela cantava no coro, velava os defuntos, comia velas, crucifixos, pintava os santos e despia-os a sós. Ele voava em papagaios de papel, comia as pautas e dormia dentro de um piano. Ela vagueava entre ele e o céu.
Ele já lá estava.

16/12/07

ENCONTREI UMA CABEÇA NA PRAÇA DE LONDRES

Ontem, na Praça de Londres quando andava às compras encontrei uma cabeça de homem. Qual não foi o meu espanto quando a cabeça me disse.
- Por acaso não viu o resto?
Estranhei a pergunta mas, mesmo assim, dei uma olhadela e nada. Olhei ainda o Guerra Junqueiro. O sacana ainda me levantou a bengala mas mais não disse. Agora já mais tranquilo pensei: que fazer com uma cabeça do homem? Leva-la à esquadra? Não! Pô-la no contentor? Não! Não viesse por ai o tal resto. Preocupado estava!
Mas uma cabeça assim... digamos... era de facto um achado fabuloso.
Levantei-a e disse-lhe:
-Que está a pensar fazer?
- Olhe, isso de facto agora é complicado sabe. O problema é este: Primeiro, vou-lhe pedir um favor. Tire-me aqui de cima da capot não vá cair daqui depois é que são elas! Agora se me desse um cigarro seria óptimo! Sabe, tinha-os no bolso. Agora de qualquer maneira estava a pensar ir para casa. Mas... está difícil estava a pensar se... a senhor não me ajudaria a lá chegar.
Mas como??
- Olhe, talvez a maneira mais rápida de o fazermos seja esta. Pegue-me pelos cabelos, depois com cuidado na orelha esquerda, de seguida abra o carro e coloque-me ali entre os bancos de trás e o da frente. Assim não rebolo.
Mas levar uma cabeça no meu carro?
- Desculpe! Mas aqui é que não posso ficar! Se não for a senhor será alguém a levar-me!
Bem...então...acha que ali entre os bancos não...
-Acho!
Então e onde mora? Conheço muito bem! Avançamos Lisboa fora claro, sempre devagar não fosse ela andar por ali aos trambolhões. Chegados ao bairro a coisa complicou-se não dava com a rua nem por nada, mesmo assim a cabeça tentava "gesticular." Já em estado de desespero páro o carro, ponho-a em cima do tabeliet então com um piscar de olhos lá percebo a direcção. Volto a Avançar e nada! Qual rua qual carapuça! De repente vejo um táxi e qual não é o meu espanto, Ainda era preto e tinha o capot verde, ainda existem coisas fabulosas! Num acto inesperado encontro a rua finalmente. Agora falta o nº45, e o 6º Esq., pronto cá esta! Saio do carro e digo-lhe que espere, fique, tenha paciência.
Toco no 6º Esq e nada. Volto a tocar. Então o trinco abriu-se subo, subo, subo e aterrado qual não é o meu espanto quando a porta se abriu.
Aparece o corpo de um homem que me diz: Onde é que eu ando com cabeça!
Quando começo a descer a escada oiço um Pum! Pum! Era a cabeça a tentar subir a escada. De repente passa-me o corpo a correr escada abaixo. Estranhamente vi-os a interligarem-se o corpo pegou-a com o braço e fê-la rodopiar sobre o pescoço. Ainda ouvi um clique.
Ao chegar ao carro vejo- o táxi preto claro com o capot verde. Fabuloso.

15/12/07

DE REPENTE O ALFABETO DESCEU RUA ABAIXO

Reunidas as letras decidiram: Fugir hoje.
Também fui informado de que a pontuação estava de saída.
Portanto vou escrever depressa!
Esta coisa das letras andarem loucas tem coisa! De qualquer forma aqui no teclado ainda existem mas...que ideia tiveram estas gajas? Ainda por cima são 22.30. Será que os números também se vão pirar? Mas onde irão estas tipas todas? Sim. Porque aqui no Alentejo estou mesmo a ver o abecedário todo a correr vila abaixo. E claro como será que vão pedir o jantar ao tipo da tasca?
Ora, estava eu aqui a pensar...que de facto esta ideia só pode ter vindo do Z. Este tipo Nunca diz nada! Mas vendo bem as coisas é impossível impedir uma fuga desta dimensão.
Imaginem como seria a vida do A sem o R. Para já tínhamos um problema de oxigénio! E claro como sobreviveriam estas tipas num restaurante. Sim! Teriam que se reunir por tudo e por nada porque quem de facto não se junta, não come.
Outra coisa imaginem o M. Sim porque um homem por vezes tem de dizer ERDA! Agora sem o sacana do M a coisa complica-se.
Agora, outro grave problema é a pontuação. Imaginem as ,,,,,, viradas do avesso. Os ......iam para os hospitais. Os --- eram contratados por o Ministro das Finanças.
Socorro!! Os ~~ estão em fuga! Estao! Estao!
Mas meus amigos! o Sacana do prontuário ortográfico acabou de se pôr a milhas. Ainda o vejo a descer a rua ali, reunido com as sacanas das letras. E agora aqui sentado entram pela janela o R, D, G ,S, P. Mas o A, K, D, U caíram na lareira. Espavorido chamo os bombeiros! E então. lá aparecem os B, os O, os M, os B, os E, os I, os R, os O, e os S. Abro a janela e lá o vejo o Z atrás de um cão preto parecia-me zangado. É a vida.

09/12/07

ENROLEM AS ESTRADAS, OS CAMINHOS DE FERRO E SE PUDEREM JANTEM

Tragam as bruxas de pano, tragam os fantoches das feiras,os loucos dos manicómios, tragam os palhaços dos circos, tragam os trapezistas das cordas, tragam os músicos das orquestras, tragam os aviões dos céus, tragam os elefantes das florestas,as crianças das escolas, tragam os barcos do mar, tragam os médicos dos hospitais, tragam os cientistas, tragam-nos todos em conjunto.
E depois tirem o pano às bruxas, as feiras aos fantoches, a loucura aos loucos, os colegas às crianças, os circos aos palhaços, as cordas aos trapezistas, as orquestras aos músicos, os céus aos aviões, as florestas aos elefantes, o mar aos barcos, os doentes aos médicos, as cobaias aos cientistas.
depois, comam as as bruxas, queimem as feiras,os palhaços, os loucos, cortem as cordas aos trapezistas, comam a música, espanquem as crianças, rasguem os céus, cavalguem nos elefantes, esvaziem o mar, mediquem os médicos e comam as cobaias.
Depois enrolem as estradas, os caminhos de ferro, destruam as pontes, abram as barragens e se puderem jantem.

MANUEL COMOVIA AS PRÓPRIAS TELAS

Acabou de ser inaugurada na Galaria Contexto a Exposição de Manuel Gustavo. Este artista, actualmente conexamente ligado à grande luz Europeia das últimas décadas. Traz agora a Lisboa as cores do cobalto com traços verdadeiramente comoventes onde o ocre e o amarelo emergem soltos. Nas suas últimas pinceladas realizadas na cidade luz na década de 90. Manuel comovia as próprias telas. São conhecidas as trágicas relações que este, inspirando-se nos roxos, lilazes, o amarelo. Eufóricas as telas cantavam. Deslocavam-se voando em partituras de cores quentes. Mas agora Lisboa! Expõe laços de cores, quadras do Reno, os cinzentos da escola modernista e claro seiscentista. Aqui de novo o artista contrapõe a paleta dos sonhos cromáticos, anacrónicos a luz penetra nas telas de Manuel. Certamente é a única exposição que Lisboa actualmente reconhecerá no tempo.
Esse, o tempo de Paris com o mestre Luciano Picoufieve. O artista que agora expõe sorveu as cores destas telas expostas. Por este facto encontra-se inpossiblitado de comparecer na inauguração. Em sua representação estará presente uma caixa de pó de arroz. Esta mostra imperdivel encontra-se em Lisboa. Rua da Escola Politécnica nº 23 até dia 30 de Dezembro.

08/12/07

DIGAM-LHE

Digam-lhe:

Que a lonjura não existe. Que o tempo passa, falem-lhe do mar, das Colinas, dos Montes, chamem-na. Nos Vales, Campos, trilhos e Veredas. Mas encontrem-na! Descubram-na no cimo dos Penedos, nas Serras, nos Soutos. Uivem! Gritem! Mas quando a virem digam-lhe:

Que existem outras Serras, outros Penedos, outros Montes, outros trilhos. Digam-lhe também que os sonhos constroem-se. Digam-lhe que todos os diários são sonhos. Contem-lhe que os sonhos também são grandes. Digam. Digam aos sonhos para fugirem com ela. Digam-lhe para não ter medo. Digam onde for mas digam-lhe. Digam!
Se for preciso chamem o tempo, a música, o Mozart, as Sonatas, os pianos, os pássaros, os Actores, as Bailarinas, o Público, as palmas, os Cocheiros, os Nobres. Vão por Palácios, Quintas, Herdades, subam os Rios, corram os Desertos. Mas digam-lhe!

OS BANCOS EM UNÍSSONO DECLARARAM: TRAZ OUTRO AMIGO TAMBÉM!

Lá do cimo da Cimeira declararam os banqueiros Europeus em uníssono: A partir de hoje todos nós, brancos e bancos europeus vamos pensar em vocês. Pobres, famintos, desalojados, doentes, enfim... quando os os vossos aviõezinhos descolarem rumo ao outro continente podem estar cientes de uma coisa: Que, sendo a Europa rica, culta, solidária, católica, plural. É a Europa dos amigos millennium. Vamos a partir de hoje, podem Vexas ficar descansados, Cooperar, realizar, investir, doar-lhes sopas, calças, sapatos, arroz, copos de plástico, aspirina e fraldas. Em relação ao vosso eterno problema financeiro, declaramos que esta cimeira tem uma solução. Após uma acalorada discussão entre vários accionistas desta europazinha, chegou este conselho de administração a uma conclusão: Propomos abrindo claro, agências em todos os países africanos independentemente dos regimes. Propomos ainda que todos os dignos representantes desta cimeira comprem acções desta Europa. Solidária com os filhos e claro solidária com os amigos. Gostaríamos de vos presentear abrindo claro, bancos com esta visão solidária onde a estratégia assenta no dito: Um por todos todos por um! Assim, sugerimos-vos que: Quando virem o próximo milenium não hesitem. Exijam! Exijam! Vão ver que não custa nada! Vão ver como a vida é outra! E claro espalhem a notícia! Mandem as formigas informar as populações! Digam que nós somos assim! Digam que a Europa mudou! Digam! Digam que os bancos aqui são solidários! Que ajudam os mais desfavorecidos! E claro espalhem o slogan deste millennium : TRAZ OUTRO AMIGO TAMBÉM!

06/12/07

MAS JESUS NASCEU EM BELÉM?

Meu caro,
Sendo Belém uma presença constante nas televisões espero sinceramente que Vexa esteja em forma.
Pois ouvi por ai dizer algo de facto estranho, muito estranho. O meu amigo, imagino, sendo católico, claro como bom português é nosso! Claro, espero que tenha lido, ido ao cinema, feito o presépio, posto as palhinhas, os mémés, o musgo, enfim... como todos nós. Sabe com certeza que as galinhas botam os ovos, os patos fazem quáquá, Também estou seguríssimo de que concordará comigo que as criancinhas vêm com as cegonhas do Eliseu.
Sendo o Eliseu, o fabricante europeu de bebés. Sendo Belém o local do nascimento de Jesus Cristo.
Proponho já o seguinte: Que Maria volte! Que José seja chamado a depor! Que os patos deixem de fazer quáquá! Que os mémés se calem! Que as cegonhas fiquem quietas! As galinhas não botem os ovos! E, claro, que seja chamado o professor Barreto para dar uma explicação de como o Alqueva se pode assemelhar ao nascimento. Começando claro por o rebentamento das águas!
Ordeno aos fabricantes de preservativos que incluam na bula o seguinte: Este balão é decorativo. Porém podem ter efeitos surpreendentes em países como Portugal.
Proponho ainda, a presença do Zézé Camarinha para de uma vez explicar como se faz! Se é bom? Se serve para alguma coisa? E claro com a longa experiência do Zé quero deixar aqui uma última:
Portugueses! Leiam o Borda d`Água!
QUALQUER SEMELHANÇA ENTRE ESTE TEXTO, E A REALIDADE É ISSO MESMO.
MERA COINCIDÊNCIA